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Lábios

Lábios

João Tamura

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Sabemos a dor, sabemos o corpo, sabemos a cor um do outro
Sabemos as mãos, sabemos que não tocam em nada se não ouro
Nascemos do chão: Nara, Japão; palavras que fazem o choro
Crescemos em vão, respira pulmão — falácias que cabem no sonho
Sutura segredos, a cura dos dedos, das mãos, das bocas
A culpa dos medos, vês o que temos: a solidão das putas
O médio formato da vida onde tudo é mais belo
Que nos faz esquecer a merda, o desespero, o nosso medo
… e onde a noite é mais barulho
Eu e ela e o futuro num red eye desde Guarulhos
As mãos não têm fim — só tocam no que é puro
Com a mesma audácia com que vão engolindo o escuro
A maldade — tu despe-a; na cidade com a neve
E a vaidade, tu perde-a, em Belgrado, Sérvia
E o escuro longe lá vai — são cores de Wong Kar Wai
A volúpia aos poucos cai e tu és túlipas a mais
E loucos, ficamos perdidos. o Monstro Precisa de Amigos
Aos poucos com os anos sozinhos, tornamo-nos em vidros
E talvez um hotel onde a pele exposta sob o cós
Na ponta de um império em guerra que nós somos sós
Sabemos a dor, venenos do corpo, sabemos o sabor um do outro
Fazemos as mãos e vemos que não tocam em nada se não ouro
Nascemos do chão: Shimada, Japão; promessas que fazem o choro
Morremos em vão, inspira pulmão — falácias que cabem no sonho
Demos do eu, cremos no céu, nas pernas, nas bocas
Vénus do fel, vemos no véu a solidão das putas
O médio formato da vida onde tudo soa eterno
Que nos faz esquecer a merda, falta o tempo, cresce o medo
… e no interior em demasia
Lábios maus que mal me guiam fazem e vendem distopias
Animal-rainha, a boca faz mais que mentir
São os dias que tu crias aquilo que me obriga a partir
Veneza, Deusa? é sede ou seda? é treva ou caos?
Quão bela a presa? o que pede a queda? pedra ou paus?
São beijos como o primeiro, os joelhos caem-me inteiros
O peito com tal arquejo, tal Artemis do desejo
Ensina-me a ser eterno às custas das derrotas
Perguntas e respostas, curvas das tuas costas
O caminho do teu dorso que percorro como se fosse
Vinho e eu com sede — trato o corpo como um poço
Afina a palavra que é breve, quão fina camada de neve
Definha o que a vida nos pede, é vinho o que a língua merece
E talvez um motel onde a pele exposta sob o cós
Na ponta de um império em guerra que nós somos sós
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